quarta-feira, 4 de outubro de 2017

INSS: Entenda porque a Revisão do Teto não se trata de uma mera "revisão"


De acordo com a legislação previdenciária, existe um teto previdenciário que o INSS está obrigado a cumprir em vários momentos no cálculo do valor do benefício previdenciário.

Caso o salário de benefício do segurado seja superior ao teto previdenciário na data do cálculo, ele será limitado ao teto. A fórmula do primeiro reajuste desses benefícios que foram limitados ao teto é diferente dos demais benefícios (aplica-se o chamado “índice-teto”).

Neste artigo, explico o mais simplificadamente possível o que é o índice-teto, como ele deu origem à tese da revisão do teto e porque ela não é exatamente uma “revisão” no sentido que estamos acostumados.

Não é meu objetivo esgotar a matéria, pois trata-se de uma revisão complexa, que exigiria um verdadeiro curso de várias horas. No entanto, certamente o leitor conseguirá ter uma base sólida de entendimento do assunto.

Vou dividir o artigo em vários “blocos” de conhecimento que são pré-requisito para entender a revisão, e depois irei juntar tudo para que o leitor não fique perdido. Então não estranhe se eu mudar de assunto repentinamente.

1) “Eu vejo tetos previdenciários” - “Quando?” - “O tempo todo…”
O teto previdenciário não é aplicado uma única vez durante o cálculo do valor do benefício previdenciário.

Na verdade, ele é aplicado quatro vezes: nos salários de contribuição, no salário de benefício, na renda mensal inicial e na renda mensal reajustada.

[Obs.: O valor do teto em 2.017 é de R$ 5.531,31. Para consultar os valores do teto de anos anteriores, veja a página da Previdência Social: “Histórico do valor do salário mínimo e teto para contribuição”.]

Vejamos:

Salários de contribuição (SC) limitados ao teto
Lei 8.213/91, Art. 135. Os salários-de-contribuição utilizados no cálculo do valor de benefício serão considerados respeitando-se os limites mínimo e máximo vigentes nos meses a que se referirem.
Salário de benefício (SB) limitados ao teto
Lei 8.213/91, art. 29, § 2º O valor do salário-de-benefício não será inferior ao de um salário mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição na data de início do benefício.
Renda Mensal Inicial (RMI) limitada ao teto
Lei 8.213/91, Art. 33. A renda mensal do benefício de prestação continuada que substituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado não terá valor inferior ao do salário-mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição, ressalvado o disposto no art. 45 desta Lei.
Renda Mensal Reajustada (RMReaj) limitada ao teto
Lei 8.213/91, art. 41-A, § 1o Nenhum benefício reajustado poderá exceder o limite máximo do salário-de-benefício na data do reajustamento, respeitados os direitos adquiridos.
Se você está estranhando um pouco o jargão dos cálculos previdenciários, recomendo assistir a minha palestra online, na qual esclareço várias coisas sobre a matéria de uma forma bem fácil de entender. Clique aqui para fazer a inscrição gratuitamente.

2) Reajuste dos benefícios previdenciários
Os benefícios previdenciários são reajustados anualmente desde 1995, juntamente com o salário-mínimo (art. 41-A da LB), para que mantenham seu poder de compra.

[Obs.: Antes de 1995, havia mais de um reajuste por ano, devido à alta inflação que tínhamos no período.]

Art. 41-A. O valor dos benefícios em manutenção será reajustado, anualmente, na mesma data do reajuste do salário mínimo, pro rata, de acordo com suas respectivas datas de início ou do último reajustamento, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor - INPC, apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.

§ 1º Nenhum benefício reajustado poderá exceder o limite máximo do salário-de-benefício na data do reajustamento, respeitados os direitos adquiridos.
Ou seja, todo início de ano os benefícios previdenciários sofrem um “aumento” que, na verdade, nada mais é do que o reajustamento, para que o benefício mantenha o seu poder de compra frente à inflação.

3) Reajuste dos benefícios previdenciários limitados ao teto - o “índice teto”
Percebendo que a lei 8.213/91 exagerou ao aplicar o teto previdenciário tantas vezes durante o cálculo do valor dos benefícios, o legislador procurou corrigir este erro através das leis 8.870/94 (art. 26) e 8.880/94 (art. 21, § 3º), que criaram o chamado “índice-teto”.

[Obs.: a lei 8.870/94 criou a revisão chamada de “Revisão do Buraco Verde”, sobre a qual tratarei em outro artigo.]

O objetivo do índice-teto é recompor parte do valor perdido pelo segurado quando seu salário de benefício foi limitado ao teto no momento do cálculo da sua RMI (Renda Mensal Inicial).

Ele funciona assim: no momento do primeiro reajustamento do benefício será aplicado tanto o reajuste da inflação (igual a todos os outros benefícios) MAIS o índice-teto.

[Obs.: O índice-teto é variável e deve ser calculado de acordo com o caso concreto.]

No entanto, de acordo com a lei, a aplicação do índice-teto não pode ultrapassar o teto previdenciário daquele ano.

O índice-teto decorre de lei e é aplicado pacificamente pelo INSS. Não estamos falando ainda da revisão do teto, ok?

Dessa forma, a lei 8.880/94, apesar de ter atenuado o rigor dos cálculos previdenciários, é ainda bastante limitada pois:

o índice-teto é aplicado uma única vez (juntamente com o primeiro reajustamento);
a aplicação do índice teto não pode resultar em valor superior ao teto daquele ano (ano do primeiro reajustamento).
Como o leitor já deve ter percebido, existem alguns casos (não todos) em que o índice teto foi aplicado e resultou em valor maior que o teto, de forma que o benefício foi, novamente, limitado ao teto.

O benefício dessas pessoas todo ano é reajustado para refletir a inflação (como quaisquer outros), com o mesmo índice que é utilizado para reajustar o teto previdenciário, de forma que o valor do benefício delas seria sempre o valor do teto previdenciário.

No entanto, em dois momentos o teto previdenciário teve um aumento acima da inflação, o que não foi repassado para esses benefícios.

4) Aumento Real do Teto Previdenciário - Emendas Constitucionais
Todos os anos, o teto previdenciário é reajustado para refletir a inflação do ano anterior (o mesmo índice aplicado para a correção dos benefícios).

No entanto, em dois momentos, o teto previdenciário teve um aumento superior ao teto. Esses dois aumentos ocorreram em decorrência das Emendas Constitucionais 20/1998 e 41/2003.

5) A Revisão do Teto NÃO é uma Revisão!
Estudiosos do Direito Previdenciário passaram a defender que os benefícios que foram limitados ao teto na forma explicada acima deveriam ser reajustados para refletir o aumento real do teto das Emendas Constitucionais 20 e 41 (até o limite do valor real de seus salários de benefício).

Dessa forma, a ideia central NÃO é a modificação do valor inicial do benefício (que chamamos de revisão da RMI), mas sim o reajustamento da Renda Mensal Reajustada de forma diferenciada, para refletir os novos tetos previdenciários (sempre no limite do salário de benefício original).

Por isso a “revisão do teto” não é um nome adequado, já que trata-se de uma “readequação”.

6) Entendimento do STF - RE 564.354
Após muita discussão judicial, o STF firmou entendimento favorável ao segurado no RE 564.354 (julgamento em 08/09/2010). Segue trecho do informativo 599 do STF a respeito deste caso:

“É possível a aplicação imediata do novo teto previdenciário trazido pela EC 20/98 e pela EC 41/2003 aos benefícios pagos com base em limitador anterior, considerados os salários de contribuição utilizados para os cálculos iniciais.”
Dessa forma, a Revisão do Teto é aceita de forma pacífica atualmente pelos Tribunais.

O INSS já até reconheceu este direito, ao fazer acordo judicial na Ação Civil Pública nº 0004911.28.2011.4.03.6183 (com trâmite perante a 1ª Vara Federal Previdenciária de São Paulo).

7) Outras revisões que refletem na revisão do teto
Algumas outras revisões podem refletir na revisão do teto.

Como?

É que as revisões aumentam o valor do salário de benefício (e, consequentemente, o valor final do benefício, que é a intenção de qualquer revisão).

Como o salário de benefício aumenta, é possível que ele ultrapasse o teto (ou, se já ultrapassava o teto, ficará ainda maior).

Dessa forma, teremos reflexos no índice-teto e, possivelmente, será originado o direito à readequação do teto.

Revisões famosas que podem refletir na revisão do teto são a Revisão do IRSM e a Revisão do Buraco Negro (sobre as quais pretendo tratar em artigos futuros), mas não são as únicas.

[Obs.: não aplica-se a decadência para a Revisão do IRSM nem para Revisão do Buraco Negro.]

8) Quem tem direito à Revisão do Teto?
Como eu sempre digo, para saber se alguém tem direito a uma revisão previdenciária, é preciso fazer o cálculo previdenciário para cada caso concreto, não tem jeito.

Infelizmente, não existe uma regra geral para saber, sem fazer o cálculo, se um caso vai ser favorável ou não. Existem apenas indícios, mas que não são absolutos:

Caso o salário de benefício tenha sido limitado ao teto;
Caso o segurado faça jus a uma revisão que, após efetuada, faça seu salário de benefício ser limitado ao teto.
Por isso eu sempre digo que é importantíssimo que o advogado previdenciarista domine cálculos previdenciários, já que, com isso, é possível conseguir melhores benefícios para os clientes e, consequentemente, melhores honorários.

Pensando em ajudar os colegas que têm bloqueio com cálculos previdenciários, eu preparei uma palestra online sobre este assunto, na qual eu demonstro que esta matéria não é ciência de foguete e qualquer um pode aprender. Clique aqui para fazer a inscrição gratuitamente.

9) Decadência Previdenciária
Por fim, precisamos estabelecer se é possível requerer a readequação do teto a qualquer tempo ou se é aplicada a decadência previdenciária de 10 anos.

O artigo 103 da Lei de Benefícios, que trata sobre a decadência previdenciária, é uma norma excludente de direitos. Por essa razão, deve ser interpretada de forma restritiva.

Este artigo refere-se à “revisão do ato de concessão de benefício”. Vejamos:

Lei 8.213/91, Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.

(...)
Como já vimos, nesta revisão não se requer a revisão do ato de concessão, não há pedido de alteração da RMI (como expliquei acima, trata-se de um reajustamento diferenciado).

Por isso, a revisão, ou melhor, Readequação do Teto, NÃO está sujeita à decadência do art. 103 da Lei 8.213/91.

O próprio INSS reconhece isso em sua Instrução Normativa:

IN 77/2015

Art. 565. Não se aplicam às revisões de reajustamento os prazos de decadência de que tratam os arts. 103 e 103-A da Lei nº 8.213, de 1991.

Parágrafo único. Os prazos de prescrição aplicam-se normalmente, salvo se houver a decisão judicial ou recursal dispondo de modo diverso.
[Obs.: Para ler mais a respeito da decadência previdenciária, leia meu artigo “Decadência no Direito Previdenciário: você está analisando errado”.]

Fonte: Jusbrasil e Alessandra Strazzi (04/10/2017)

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