quinta-feira, 7 de abril de 2016

Fundos de Pensão: Entrevista com o Superintendente da Previc sobre governança dos fundos de pensão e projeto de autorregulação do sistema


A newsletter COMPLEMENTO, uma publicação do Sindapp (Sindicato Nacional das EFPCs), entrevistou o diretor-superintendente da Previc, José Roberto Ferreira. Em pauta, a evolução da governança nos fundos de pensão, os próximos passos do modelo de supervisão baseada em riscos e a visão do órgão sobre o projeto de autorregulação de nosso sistema.

COMPLEMENTO: Como o senhor vê a evolução da governança nos fundos de pensão, pelo que se tem observado nos últimos anos?JOSÉ ROBERTO FERREIRA: O nosso Sistema tem evidenciado um processo de evolução da governança. Observando o momento presente, poderíamos dizer que a situação dos quadros das nossas entidades, os nossos dirigentes, é muito melhor em relação ao que se tinha há 10, 15 anos. Além da curva natural de aperfeiçoamento, aprendizado e profissionalização, existiu todo um esforço do Sistema no sentido de avançar.
Então, percebe-se que esse quadro melhorou muito. O que não nos desincumbe da obrigação e da necessidade de continuar melhorando, aperfeiçoando. Tanto sob o aspecto da qualificação dos dirigentes e conselheiros, como também das estruturas de governança das entidades, no que diz respeito à gestão de riscos.
É muito importante o Sistema entender que apesar do aperfeiçoamento, das melhorias observadas, nós temos ainda um caminho a percorrer. E o papel da Previc, o papel do Estado, é orientar o Sistema para que consigamos alçar um novo patamar em termos de governança.
A partir da análise das estatísticas da Previc, é possível afirmar que a maior parte dos fundos mantém boas práticas de governança?O nosso Sistema possui um nível de heterogeneidade que torna difícil a tarefa de agruparmos - e com maior evidência - grupos de entidades que estejam em um patamar superior ou inferior em termos de governança. O que podemos afirmar, sem dúvida, é que as boas práticas de governança têm sido buscadas e exercitadas na maioria das entidades. E cada uma delas se encontra em estágio distinto.
Nós temos entidades que possuem boas referências em governança, e referências suficientes para nos inspirar a buscar melhorias, inclusive em termos normativos e legais. E essa inspiração não está limitada à Previc; percebemos que outros agentes da sociedade também têm considerado essas referências como pontos importantes para aperfeiçoamento; seja no âmbito da composição de diretorias, dos conselhos, no processo de eleição, na transparência aos participantes. Então, são práticas importantes.
Percebemos no Sistema um momento oportuno para levarmos essa discussão no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), para que essas melhores práticas e aperfeiçoamentos possam se estender para as entidades como um todo, e não somente para um grupo.
Dentro de uma agenda propositiva para o Sistema, em sua visão, quais pontos se mostram prioritários para a revisão da Resolução CGPC nº 13/2004 e do Decreto nº 4942/2003?A Resolução CGPC nº 13 completa 12 anos de existência em 2016. E, nesse período, é importante lembrar que hoje o ambiente regulatório de fundos de pensão é muito diferente de quando a resolução foi publicada.
Então, parece-nos absolutamente oportuno uma discussão mais ampla. A Resolução CGPC nº 13 foi fundamental para o nosso Sistema, para que pudéssemos alçar esse ganho de governança. Mas nosso entendimento é de que vários pontos constantes nessa resolução podem sim ser objeto de aperfeiçoamento.
Naturalmente, essa discussão se dará no âmbito do CNPC que avaliará a conveniência e a oportunidade de rediscussão da Resolução CGPC nº 13. Nessa oportunidade, poderemos inclusive a partir de percepções, leituras e referências do próprio Sistema, levar a Previc como um dos agentes que poderão contribuir no sentido de seu aperfeiçoamento.
Temos percebido nas discussões realizadas algumas possibilidades, como por exemplo, a referência quanto ao caso das entidades (regidas pela Lei Complementar) 108, patrocinadas por empresas públicas, sobre o exercício de uma gestão compartilhada no âmbito da diretoria, tendo por base dirigentes também eleitos. Parece-nos ser uma solução de bastante êxito.
Outra discussão que se abre diz respeito a questões relativas à chapa única. Preocupa-nos o nível de autonomia objetiva que existe em um grupo único com objetivos distintos. Por exemplo, representantes de conselho deliberativo e de conselho fiscal compondo o mesmo grupo para participar de um processo eletivo junto à entidade. Preocupa-nos que nível de isenção, de segregação de interesses e de funções esses agentes terão, tendo em vista que eles compõem uma chapa única, mas os conselhos e os órgãos que eles representarão têm objetivos bastante distintos. Tem que ter uma necessária autonomia.
São só alguns exemplos de pontos que acreditamos que podem permear essa discussão relacionada à Resolução CGPC nº 13, mas cujo objeto mais abrangente se dará no âmbito do CNPC, caso o Conselho julgue oportuno e conveniente fazer essa discussão durante o exercício de 2016.
Com relação ao Decreto nº 4942, penso que o principal objetivo é concluirmos nesse momento a discussão que já acontece há quase dois anos. Existem expectativas de todas as partes. No âmbito da Previc, a principal expectativa é a oportunidade percebida de haver uma melhor distribuição das condições, das penas e dos valores de multa previstos hoje no Decreto, para que possamos ter um melhor equilíbrio em relação à sua aplicação. É outro ponto que vem a ser objeto de maior aprofundamento e abordagem. Pretendemos fazer isso ainda em 2016. Então, esperamos de fato nesse exercício oferecer uma contribuição mais objetiva em relação à rediscussão do Decreto.
Qual a agenda da Previc com relação à adoção da Supervisão Baseada em Risco?A Supervisão Baseada em Risco (SBR) adotada pela Previc tem sido objeto, no último ano, de aperfeiçoamento que busca preservar tudo o que já foi desenvolvido pela autarquia e dar um passo adicional – sem abandono aos requisitos e os pressupostos que foram desenvolvidos pela autarquia. Inclusive, esse desenvolvimento se deu originalmente com o auxílio do Banco Mundial, e todo o nosso Sistema acompanhou isso de alguma forma e se preparou para esse modelo. Então, todo esse arcabouço está sendo preservado.
A SBR é um processo natural de aperfeiçoamento. E o grande atributo desse novo paradigma e desse passo subsequente a um modelo adotado pela Previc diz respeito às possibilidades e a capacidade de inteligência investigativa que o órgão terá com relação aos atributos de predição.
Assim, o objetivo da Previc - sem prejuízo de continuar atuando, como vem atuando, com um monitoramento permanente de todo o Sistema e uma ação objetiva de fiscalização - é que ela possa agir antes que os problemas venham a acontecer. Então, é diferente. O modelo aplicado até então na Previc tem como pressuposto a ocorrência de uma ou outra operação para que, a partir da ocorrência, a Previc possa ter um objeto de trabalho.
E o que se pretende nesse momento é que esse objeto de trabalho seja prévio, e que possamos agir antes mesmo que a operação aconteça. Como eu mencionei, esse trabalho de aperfeiçoamento está em curso há mais ou menos 1 ano e a previsão é que ele tenha, ao final de 2016, uma primeira entrega com relação a sua efetividade.
Imaginamos que ao final desse ano - e a autarquia se preparou para isso e tem todo um planejamento para que isso de fato aconteça - esse novo modelo de supervisão esteja claramente implantado e em funcionamento. O que não significa que ele não possa ainda vir a ser aperfeiçoado e aprimorado, porque entendemos que esse passo será concluído nos próximos anos. Mas, ao final de 2016, esperamos ter de fato uma mudança significativa com relação à atuação da Previc no ambiente da SBR.
Em 2015, o órgão de supervisão promoveu uma ampla mudança em seu modelo de negócio. O senhor poderia comentar quais dessas transformações já são visíveis e quais ainda serão percebidas pelos fundos em 2016?Sim. O principal elemento de percepção do Sistema com relação ao aperfeiçoamento em curso, na Supervisão, se dará na aplicação do Plano Anual de Fiscalização. Esse plano traz consigo o pressuposto de uma transição do modelo anterior de SBR e já permite o exercício do novo ambiente de supervisão. Então, é um plano anual que viabiliza essa transição e alguns desses elementos serão muito interessantes na sua aplicação, alguns bastantes perceptíveis com relação às entidades.
Com esse novo plano de fiscalização se inicia um modelo diferente do anterior, no qual a Previc passa a dispor, por exemplo, de grupos de auditores fiscais e cada um deles cuidará permanentemente de um conjunto de entidades.
Qual é a diferença? A diferença é que, anteriormente, a nossas matrizes de riscos indicavam os planos e as entidades que mereciam um processo mais próximo de supervisão. Só que os auditores fiscais, os profissionais que cuidariam daquelas entidades, eram os que possuíam as melhores condições de fazê-lo naquele momento. E isso acabava gerando no tempo uma espécie de rotatividade em relação a quem tratava daquelas entidades.
O modelo agora é outro. Vamos ter um grupo fixo de auditores fiscais cuidando de um conjunto de entidades de forma permanente. Com isso, a nossa expectativa é ter um nível mais profundo de conhecimento, o que às vezes era comprometido em função do rodízio de quem atendia aquela entidade. E a própria entidade também passa a ter uma referência na Previc de quem acompanha de forma permanente a realidade de um plano de benefício que ela administra ou dela própria.
Essa mudança de comportamento certamente trará um sentimento muito maior de supervisão, sem necessariamente ter a presença física e permanente de um auditor fiscal na própria entidade.  Com uma interlocução mais próxima, um processo de comunicação muito mais estreito, no qual a entidade perceberá que o Estado, por intermédio da Previc, estará muito mais presente, sem que o faça fisicamente. Essa é a primeira grande mudança.
E quais são essas entidades? Aí sim, com base em nossa matriz de riscos, nós já temos um grupo de entidades que por motivos diversos, e essas razões são de natureza da supervisão, merecem um olhar atento por parte da Previc. E esses motivos não tem relação, necessariamente, somente com o resultado dos planos; teremos entidades que eventualmente estão com resultados historicamente superavitários, mas que por outros motivos merecem esse olhar diferenciado.
Essas entidades terão um acompanhamento permanente por parte do Estado, exatamente para tentar auxiliá-las: aquelas com um resultado positivo a manter o seu resultado, a fazer com que aquele quadro de segurança e de estabilidade possa ser estendido por muito mais tempo; e aquelas que têm outros desafios, inclusive no âmbito do desequilíbrio, possam - com a orientação do Estado e uma presença maior no sentido de buscar soluções - ter condições seguras de superar isso o quanto antes.
Resumidamente, teremos uma participação maior do Estado com uma presença menor; e isso se dará já durante o exercício de 2016. Parece-nos que essa será a grande mudança relacionada à supervisão direta.
Com relação ao monitoramento, a ideia é que este seja permanente de todo Sistema - como temos feito até então - e com abrangência um pouco maior com relação aos seus atributos.

Até então, tínhamos um determinado escopo de monitoramento relacionado, por exemplo, ao desenquadramento. E, agora, temos condições de fazer um monitoramento mais amplo, até em função das nossas articulações, dos convênios formalmente estabelecidos com os demais órgãos de supervisão como, por exemplo, o Banco Central.
Formalizamos um novo convênio que possibilitará que tanto a Previc quanto o BC tenham informações recíprocas e importantes para os trabalhos de ambos, passando a perceber e a monitorar de forma integral todas as operações. Isso será um avanço e também passa a integrar o escopo do nosso plano de trabalho para 2016.
Com a conclusão, ao final de 2016, do aperfeiçoamento do modelo de Supervisão Baseada em Risco, teremos um novo plano a partir de 2017. E aí já seria um plano de supervisão que abrange tanto monitoramento quanto fiscalização.
Qual a visão da Previc sobre o tema da autorregulação, dentro do contexto de aperfeiçoamento da governança das entidades?Bom, desde que tomamos conhecimento das iniciativas da Abrapp, do Sindapp e do ICSS no sentido de criar um primeiro código de autorregulação e trabalhar esse tema no âmbito do Sistema, a Previc viu isso sempre com bons olhos. E quando conhecemos com maior nível de detalhes sobre o que de fato se pretendia, quais eram as expectativas, o projeto muito nos animou.
Tanto que empenhamos o nosso apoio durante a reunião realizada aqui na Previc com o presidente da Abrapp e a presidente do Sindapp. E mais do que isso: um apoio cuja abrangência talvez fosse até maior do que o próprio Sistema esperava. Então, nós designamos a participação do nosso diretor de assuntos atuariais, econômicos e contábeis, Fábio Coelho, para fazer parte do grupo que está cuidando desse assunto no Sistema. Essa presença da Previc naturalmente é baseada na experiência, nos atributos que possamos trazer para, sob a forma de proposição, poder aperfeiçoar o que está sendo feito.
Mas tem outro quesito muito importante. Com esse acompanhamento, com essa visão próxima do que se pretende em relação ao Sistema, é possível, num segundo momento, pensarmos em algo como uma eventual referência positiva de autorregulação. As práticas ou a adesão de uma entidade a um código de autorregulação, por exemplo, que tenha uma referência positiva com relação aos resultados, é algo que pode e deve ser levado em consideração pelo órgão de supervisão no tocante ao processo de fiscalização.
Um código de autorregulação que tenha controle e rigor é importante para o órgão de supervisão. E será respeitado e reconhecido pela Previc como um ponto positivo à entidade que faz a adesão ao código de autorregulação.

Lembrando que essa é uma prática que já acontece em outros ambientes da sociedade brasileira. Cito como exemplos os códigos de autorregulação da Anbima e da Febraban. Esses agentes autorregulados, quando da adesão e da submissão ao código de autorregulação, também são percebidos como diferentes, positivamente, com relação à sua disposição e sua busca por melhores práticas.
No caso do nosso Sistema, o primeiro tema eleito para ser objeto desse primeiro código de autorregulação é a governança, o que nos parece absolutamente oportuno, pertinente; é um tema caro para a Previc. É um assunto importante e, por esse motivo, a Abrapp, o Sindapp e o ICSS tem todo o nosso apoio e expectativa positiva para que essa iniciativa possa ter bom resultado.
Em sua opinião, qual o salto que o Sistema precisa dar em relação à qualificação dos dirigentes e dos conselheiros?Como eu mencionei anteriormente, o perfil dos conselheiros e dos dirigentes das entidades sofreu um aperfeiçoamento no tempo. Houve uma curva natural de aprendizado e esforço muito grande por parte do nosso Sistema para a qualificação, o que nos posiciona numa situação muito melhor em relação ao que tínhamos há 10 ou 15 anos.
No entanto, o nosso Sistema precisa de mais. A qualificação é um processo permanente. E esse grande salto será mais evidente quando os assuntos relacionados à qualificação, a certificação e a habilitação ganharem maior compreensão e fluírem de forma mais tranquila ao nosso Sistema.
Um exemplo que eu sempre cito é de que um dirigente ou um conselheiro de um fundo de pensão não tem responsabilidade menor, não é menos importante do que um dirigente de uma instituição financeira. Até porque os resultados dos trabalhos, por exemplo, de uma seguradora ou de um banco com relação aos recursos de terceiros se dão no curto prazo. Então, essas instituições têm um ciclo menor e ainda assim possuem um nível de exigência muito grande para com aqueles dirigentes.
No caso dos fundos de pensão, os resultados se dão às vezes em décadas. Dessa forma, é natural que o nível de exigência relacionado à formação, conduta e experiência dos nossos dirigentes e conselheiros não podem ser menores do que é exigido de um representante daquelas outras instituições, porque além da entrega e do resultado que se dará num prazo muito mais longo, existe um atributo adicional que é o de confiança.
Esse atributo de confiança, para ser exercido de forma adequada perante os nossos participantes e patrocinadores, exige da parte dos dirigentes e dos conselheiros um nível muito grande de profissionalismo.
Então, mais uma vez, essa busca tem acontecido. Nosso Sistema registra uma evolução significativa com relação aos nossos quadros de dirigentes e conselheiros, mas nós precisamos de mais.

Fonte: Sindapp (março 2016)

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