Sebastião Sahão Junior
Sebastião Sahão Junior, presidente do CPqD.
Há pouco mais de quatro meses à frente do CPqD, Sebastião Sahão Junior, o Tuca, trabalha para equilibrar o fluxo de caixa, prosseguir as medidas que já vinham sendo adotadas de racionalização administrativa e quer avaliar os investimentos da fundação em empresas. “Vamos ver se faz sentido continuar sócio, se majoritário ou minoritário. É hora de avaliar cada investimento, e também de revisitar as linhas de negócios”, explica ele.
Se o momento é de contenção de despesas e de equilíbrio do fluxo de caixa, impactado pelos atrasos constantes dos repasses do Funttel (Fundo de Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) que começam a ser resolvidos, o desempenho do CPqD no primeiro semestre foi razoável. “Faturamos 102% da meta”, conta ele. Mas a ordem do novo presidente, no CPqD há quase 30 anos e ex-VP de administração e finanças, é racionalização e foco na gestão.
Os problemas de atraso nas liberações do Funttel estão em parte contornados. Foram os constantes atrasos que levaram ao desgaste nas relações entre o ex-presidente Hélio Graciosa e o governo (leia-se Secretaria de Telecomunicações do Minicom e Conselho do Funttel) e que desaguaram em seu pedido de demissão, em maio deste ano.
Com a troca de comando, o que estava paralisado começou a andar. Este ano foram liberados R$ 11 milhões e a promessa é liberar mais R$ 24 milhões até dezembro. Mas não existe cronograma definido. “Nenhuma previsibilidade”, como reconhece Sahão Junior, embora entenda ser muito difícil conseguir um cronograma em tempos de contenção de recursos como os atuais.
Mesmo representando menos de 15% da receita anual do CPqD, Sahão acredita que os recursos do Funttel são estratégicos para a fundação pois são eles que permitem investir em novas tecnologias, em inovação, em projetos que não têm retorno imediato. “O Funttel é estratégico para o DNA do CPqD. Não vou fazer o discurso de independência em relação ao Funttel”, garante ele, que pode ter até um estilo diferente de gestão, mas defende os mesmos eixos estratégicos que orientaram o trabalho da fundação nos últimos 20 anos.
Tele.Sintese – O CPqD enfrentou problemas de caixa no início do ano, que acabaram indiretamente levando à demissão do ex-presidente Hélio Graciosa. Esses problemas estão superados? O que muda em sua administração?
Sebastião Sahão Jr -  Começamos o ano até que razoáveis em termos de carteira clientes e eu diria que, apesar de todo esse cenário econômico,  2015 foi o melhor ano de venda do CPqD no primeiro semestre. Atingimos 104% de nossa meta. O problema não foi a carteira, foi que tínhamos uma expectativa de receber as liberações do Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) e essa expectativa não foi atendida no prazo em que a gente precisava. Isso dificultou demais nosso fluxo de caixa, o que agora está sendo normalizado.
Como o CPqD ficou com uma gestão durante mais de 20 anos, é natural que quando assume uma nova haja mudanças. Mas nós não vamos mexer em nossa essência e em nosso modelo de operação. Nosso modelo de operação, baseado na inovação, P&D, mercado e empresas, vai ser mantido. Vamos olhar como a gente pode melhorar a gestão desses três pilares de operação do CPqD. Olhando para P&D, para nossos temas estruturantes, para as nossas plataformas.
Tele.Síntese – Comenta-se que os problemas enfrentados pela Padtec, controlada pelo CPqD, também estariam afetando o controlador. Afinal, o que aconteceu na Padtec para a troca de seu presidente?
Sahão – A Padtec está superando os problemas detectados e nós vamos precisar de um pouco de paciência para que ela possa, principalmente com essa conjuntura atual, atravessar e superar de vez todas as suas dificuldades. O problema lá foi de gestão. Em termos de conteúdo tecnológico, a PadTec concorre em pé de igualdade com seus concorrentes, com os grandes players (do segmento de transmissão óptica). O problema dela é de gestão. Então, dentro de nosso modelo, nós vamos fortalecer a nossa gestão. Gestão em resultados em P&D, em resultados de mercado, olhar a nossa governança corporativa, através das empresas. Não é só criar as empresas, é olhar a governança, porque você viu o impacto que teve a crise da PadTec no CPqD. Nós fomos afetados e estamos contornando toda a situação.
Tele.Síntese – Voltando a questão do fluxo de caixa e da liberação das verbas do Funttel, que estavam retidas. O governo já definiu um cronograma de liberação?
Sahão – No meio do ano, governo aprovou o PAR – Plano de Aplicação de Recursos. Sem aprovar o PAR, ele não tem como empenhar e fazer as liberações. Isso foi aprovado no Conselho Gestor do Funttel. No conselho aprovaram também R$ 35 milhões para o PAR 2014-2017. Aprovaram também um pleito do CPqD de considerar, como projetos do Funttel, até um determinado período de desenvolvimento, os projetos – Tudo IP e TSAM (Tecnologias de Segurança para Ambientes Móveis) – que estavam sendo desenvolvidos e sobre os quais o conselho tinha dúvidas se cabiam ou não dentro dos objetivos estratégicos do fundo. Vão fazer o ressarcimento de tudo aquilo que nós desenvolvemos até um determinado período. Concordaram com isso, que também mexia em nosso fluxo de caixa.
Tele.Síntese  – Em que fase está esse processo está esse ressarcimento?
Sahão - Estamos apresentando prestações de contas, a Finep está avaliando essa prestação de contas para dar um ok e ter uma auditoria do ministério para que esses recursos, de R$ 15 milhões, poderem ser liberados. Tudo IP é um dos maiores projetos qu temos aqui, que é nosso sistema de gerenciamento da planta externa. Na época, quatro anos atrás, chamamos de Tudo porque a planta está migrando para o mundo IP e nós estamos migrando essa plataforma para o mundo IP. Isso demandou muito recurso, na época aprovamos o projeto no Funttel e viemos desenvolvendo. Durante as discussões, eles (o Conselho do Funttel) priorizaram alguns projetos, até pela limitação de recursos que tinha o ministério. Eles priorizaram mais a parte de comunicações ópticas e a parte sem fio e pediram que essa parte fosse descontinuada, em função da limitação de recursos. Então dissemos ok, vamos encerrar e fazer a prestação de contas para sermos ressarcidos pelo que se investiu, aprovado anteriormente pelo Conselho Gestor do Funtel. Na parte final, que faltava para concluir o projeto, o CPqD investiu recursos próprios.
Tele.Síntese – Mas, afinal, existe ou não um cronograma de liberação dos recursos?
Sahão - Tudo isso mexe com nosso fluxo e nos trouxe um desafio maior para fazer a gestão, para equilibrar nosso caixa frente a gestão de fluxo e também da falta de previsibilidade do repasse de recursos pelo ministério. Seria bom se eles dissessem “vou aprovar o PAR e, a partir disso, liberar tantos milhões por mês para cumprir este orçamento”. Mas a gente sabe da dificuldade do governo, do Tesouro, de liberar os recursos.
Já liberaram R$ 10 milhões, agora liberaram mais R$ 1 milhão. Eu conversei com o secretário (de Telecomunicações do Minicom) e eles estão batalhando. Apesar de toda a dificuldade do governo, com essa contenção, com esse enxugamento do orçamento, eles querem até o final do ano cumprir com esses R$ 35 milhões, ainda no exercício de 2015. Nós temos essa expectativa. E se não acontecer? Vamos ter que trabalhar, aqui, com os recursos e com a engenharia financeira para poder atravessar esse período. Essa não previsibilidade dificulta a gente na gestão de caixa, principalmente no momento em que estamos passando.
Tele.Síntese – Você disse que o primeiro semestre surpreendeu positivamente. Como?
Sahão - Nós tivemos um primeiro semestre bom. Faturamos mais este primeiro semestre, 102% da meta, e vendemos mais, 104% da meta. A receita operacional é responsável pelo superávit do CPqD. Agora, o problema de caixa vem de anos anteriores e não dá para equilibrar de uma hora para outra. O que nós fizemos no primeiro semestre, inclusive com a presença da diretoria executiva anterior, foi otimizar a área de suporte e adotar ações de sinergia, como fundir diretorias que tinham muita sinergia de atuação. Em 12 meses, isso representa um ganho de R$ 10 milhões para o CPqD. E vamos ter outras ações. Esta é nossa filosofia de gestão, daqui para frente. Nós não queremos reduzir o CPqD, transformá-lo em uma organização menor. Queremos uma organização grande e, para isso, temos que focar a gestão. Gestão de caixa, gestão dos investimentos, de nossa política de P&D, de mercado, das empresas.
Houve mudança nos projetos?
Os projetos são os mesmos. E agora estamos tentando trazer outros, o Funttel está abrindo outras oportunidades de relacionamento com o CPqD, estamos levando outros projetos para discutir. Estamos discutindo com o ministério e com o Funttel para começar a trabalhar com a plataforma da Internet das Coisas (IOT), desse mundo totalmente interconectado, para em cima dele começar a propor projetos que tragam cada vez mais melhorias, seja para os municípios, para o nosso país, para nossos clientes. Também estamos com a proposta de desenvolver um projeto piloto de uma cidade inteligente. Temos muitos projetos para discutir. E temos que finalizar os que estão em vigência. Não dá para parar. Agora, também não dá para sonhar muito. A gente sabe que os recursos são limitados e que o governo, hoje, tem uma dificuldade de orçamento. Então, uma coisa que não vamos mais fazer aqui no CPqD é antecipar uma equipe, uma estrutura, aguardando uma possível liberação. Este foi um aprendizado que tivemos aqui. Para você ter uma ideia, em 2013, nós tínhamos uma estrutura de desenvolvimento em que consumimos R$ 73 milhões, porque tínhamos uma perspectiva grande de projetos, vários estudos em andamento. E caimos de R$ 73 milhões para R$ 35 milhões de recursos do Funttel. Tivemos que manter a estrutura principal de P&D e realocar as demais pessoas em outros projetos para não ter que fazer uma demissão em massa. Agora, precisamos de tempo para reequilibrar o caixa.
Tele.Síntese – Você falou de projetos que são de ponta, de novas tecnologias. E a atuação no mercado, como você está vendo? Ela precisa ser mais azeitada, o CPqD precisa ser mais agressivo?
Sahão - Sim, falei muito sobre o eixo P&D. Agora vamos para o eixo do mercado. O CPqD tem hoje seis verticais no mercado. Indústria, Defesa e Segurança, Finanças, Telecom, Administração Pública e Utilities. Nós vamos olhar para essas verticais, para nosso portfólio e para nossas plataformas tecnológicas e vamos ver onde realmente focar. Temos um portfólio muito grande e isso demanda recursos, demanda investimentos, demanda ações de mercado. Tudo isso custa. Hoje, em função dessa limitação toda, temos que apostar em algumas verticais e em alguns produtos. Então, vamos começar a olhar fotemente a rentabilidade de nossas soluções e ver em que devemos continuar investindo e o que vamos ter que descontinuar. Estamos fazendo essa análise. E vai haver mudanças de gestão buscando, também no nosso pilar Mercado, buscando maior oportunidade, maior sinergia.
Vamos olhar para o Mercado assim como vamos olhar para nossas empresas, das empresas do Universo CPqD. Vamos continuar participando de determinadas empresas ou não? Vamos continuar sendo majoritários, vamos ser minoritários? Então, também estamos discutindo qual será nossa estratégia de participação e de criação de empresas. Fizemos uma primeira discussão com nosso Conselho Curador e vamos fazer outra, olhando para esses três pilares: P&D, Mercado e Empresas.
Tele.Síntese – Nos últimos anos, o CPqD está cada vez mais independente dos recursos do Funttel, que são importantes para P&D e para inovação. Mas o grosso dos recursos não vem do Funtel, vem do que o CPqD produz no mercado, não é?
Sahão - Todo mundo fala que o CPqD está cada vez mais independente, mas essa independência é relativa. Não tem como o CPqD investir em algumas linhas sem o montante que vem do Funttel. O Funttel é importante para o CPqD, não queremos ficar independentes dele. Não temos que pensar em independência do CPqD em relação ao Funttel, temos que pensar em ter uma parceria com o governo e trabalhar bem esses recursos. Essa parceria é importante para o CPqD, estamos falando de R$ 35 milhões. O que queremos é trabalhar cada vez melhor esses recursos, que são limitados, junto com o ministério. Não vou colocar esse discurso de que o CPqD quer ficar cada vez mais independente do Funttel.

Fonte: TeleSíntese (09/11/2015)