terça-feira, 4 de agosto de 2015

Planos de Saúde de Fundos de Pensão: Autogestão em saúde pode trazer dor de cabeça às entidades, patrocinadoras e usuários


As estatísticas do IBGE e do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS) não deixam, infelizmente, dúvidas quanto ao enredo do desafio que se tem à frente. Motivos há para olhá-las com atenção e, no caso dos fundos de pensão que administram planos de saúde na modalidade de autogestão, pode-se dizer que seus dirigentes andam crescentemente preocupados e têm bons motivos para isso.

“Cabendo lembrar que o problema não deve preocupar apenas as entidades que têm planos de autogestão, mas sim a todas, uma vez que o desafio do financiamento da saúde afeta indistintamente a todos os participantes”, resume o Diretor Luiz Carlos Cotta, responsável perante a Diretoria da Abrapp pelos trabalhos da Comissão Técnica Nacional de Planos de Autogestão em Saúde.

No mesmo caminho - Outra que também anda alarmada mas confiante em que se encontre as soluções  necessárias é Liége Oliveira Ayub (FOTO), diretora-presidente da Sabesprev, entidade cujo plano de autogestão em saúde dá hoje cobertura a perto de 50 mil vidas. “A saúde pública é o que sabemos e a suplementar parece estar indo pelo mesmo caminho”, adverte Liége, convencida de que “existe um processo de deterioração em marcha”. Os motivos parecem ser a falta de recursos suficientes e as imensas possibilidades de fraudes existentes. “São muitos os atores em condições de fraudar”, sintetiza, persuadida da necessidade de se adequar a capacidade que o sistema tem de encontrar as soluções à velocidade com que os problemas surgem.

Rogério Carlos Lamim Braz, da Eletros e Coordenador da Comissão Técnica Nacional de Planos de Autogestão em Saúde, nota que não são apenas os custos que se elevam além da conta, mas também o número de doenças e de procedimentos a serem cobertos e que    cresce acima do que seria previsível.

Motivos para alarme - Os custos sobem por vários motivos: são eles principalmente uma população cada vez mais longeva, entrada em cena de novas e mais onerosas (ao menos no início) tecnologias e toda sorte de fraudes. E não existem dúvidas de que a conta está ficando cada vez mais salgada.

Nos últimos 60 anos, por exemplo, a proporção de idosos com 65 anos no Brasil aumentou de 2,4% para 7,4%  do total da população. No mesmo período, porém, a proporção de gastos com a saúde, em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), foi de 1% para 9%.

Preocupa pensar como será no futuro, considerando os números a seguir. Hoje, o Brasil comporta 14,9 milhões de pessoas acima de 65 anos, o que representa 7,4% do total populacional. De acordo com pesquisa do IBGE, em 12 anos, o Brasil será o sexto país com maior número de idosos em todo o mundo, e no de 2060 serão 58,4 milhões de idosos, o equivalente a 26,7% de toda a população.

Além do aumento da expectativa de vida, que passará dos atuais 75 anos para 81, o contingente populacional atingirá seu ápice em 2042. Tudo isso contribuirá para o aumento do número de pessoas idosas no país e a consequente explosão dos custos da saúde.

Mais idosos - Atualmente, menos de um terço dos beneficiários dos planos de saúde privados é formado por idosos. Em 2030, vão representar mais da metade, 54% do total. O topo da pirâmide de gastos, os idosos com mais de 80 anos, vão dobrar: passarão de 11% para 23% do total, aponta o IESS.

O efeito disso, pelas contas do próprio IESS, está longe de ser desprezível:   beneficiários de planos privados no Brasil com menos de 18 anos custam cerca de R$ 1 mil - por ano. Ja a conta com idosos acima de 80 passa de R$ 1 mil - por mês.

Por conta disso, a extensão da longevidade exerce um efeito poderoso sobre as contas. Um adulto entre os 30 e 50 anos gera uma despesa média anual de R$ 2,5 mil. Ao entrar na terceira idade, o cliente passa a representar um gasto de mais de R$ 4 mil. Aos 75 anos, a conta anual vai a R$ 9 mil.

Chances maiores - Com o avanço da idade  crescem as chances de as pessoas sofrerem de diabete, artrite, problemas de coluna, doenças crônicas, em geral, que exigem tratamentos mais caros. E, se de um lado, 3% dos brasileiros entre 18 e 29 anos sofrem de hipertensão arterial, de outro a doença acomete 55% da população com mais de 75 anos.

Levantamentos feitos na Austrália indicam que 8% da população com mais de 65 anos tem  propensão a quatro ou mais doenças crônicas ao mesmotempo. E estas não só exigem acompanhamento frequente, mas podem levar a complicações que venham a exigir cuidados mais complexos.

Triplo do custo - Tudo isso desemboca em uma projeção preocupante do IESS. Nos próximos 15 anos, os gastos das empresas com  saúde vão quase triplicar, passando de cerca de R$ 106 bilhões por ano para R$ 283 bilhões. Serão inevitáveis os impactos para todo o sistema de saúde suplementar,incluindo sobre os cerca de 54 milhões de beneficiários.

Dessa população atendida pela saúde suplementar, perto de 5,5 milhões estão dentro de planos de autogestão.

Atualmente, 35 EFPCs administram planos de autogestão em saúde. Esse número já chegou perto de 80 na década de 90 e primeiros anos do novo milênio.

Para o diretor Luiz Carlos Cotta, a inflação dos custos da saúde preocupa especialmente porque está longe de ser um fato novo, pelo contrário, parece já ter se consolidado como algo permanente, sempre acima do índice inflacionário. Em 2015, por exemplo, todas as projeções fazem esperar um crescimento médio de 20% nas despesas com a saúde, quando o IPCA, mesmo alto do jeito que anda, não deve superar a metade disso. Algo ruim para os administradores dos planos, às voltas com o problema de onde retirar o dinheiro para cobrir a diferença, e igualmente péssimo para os participantes, cujos benefícios são cada vez mais consumidos na tarefa de pagar o plano de saúde. “Sabe-se que não são poucos os obrigados a pedir desligamento do plano para ficar na dependência exclusiva do SUS”, nota Cotta.

Prev Saúde - Aliás, não é por outra razão que a Abrapp vem propondo a criação do Prev Saúde, um plano administrado à parte pelos fundos de pensão para capitalizar recursos que permitiriam aos aposentados dispor dos meios para pagar com mais conforto o plano de saúde. A proposta já foi examinada por um Grupo de Trabalho do CNPC e continua em exame.

Segundo Cotta, preocupa igualmente a “judicialização”, que a exemplo dos planos previdenciários cria, através de decisões no Judiciário, despesas imprevistas e acima dos recursos disponíveis.

Seminário em SP - Todo um quadro de complexidades que os fundos de pensão às voltas com esse tipo de problema podem, sem dúvida, enfrentar com mais tranquilidade caso se unam para compartilhar ideias e experiências e encontrar meios de, juntando forças, ganharem escala. Esse é o propósito, aliás, lembra Cotta, do 1º Seminário de Autogestão em Saúde dos Fundos de Pensão, evento que a Abrapp estará promovendo em 1º de setembro próximo, em São Paulo. Um programa que, explica Cotta, interessa tanto às associadas que administram planos de saúde como aquelas que não os têm, mas devem ser solidárias com participantes que estão no meio do fogo cruzado e naturalmente estão preocupados. Maiores informações: http://sistemas.abrapp.org.br/educaprev/eventos/autogestao.htm

Cotta chama a atenção para o lançamento, durante o evento, do “Guia de Controle de Risco em Autogestão em Saúde”, o tipo da publicação capaz de ajudar os gestores a enfrentar um momento tão difícil.

União traz mais força - A maior união das entidades, algo que o evento de setembro tende a favorecer, é uma necessidade na avaliação de Liége, para que juntas possam fazer frente a um quadro que ela tem na conta de muito desafiador. “A ANS controla as operadoras, mas não tem quem faça o controle dos hospitais, médicos e clínicas”. E a cobrança não pelo procedimento realizado, mas sim sobre os itens gastos, acaba tornando uma tarefa de enorme complexidade saber o que foi exatamente consumido, o que é um convite para a fraude. E nem precisa de fraudador para tornar tudo isso uma enorme dor de cabeça, considerando os efeitos da subida do dólar e o fato de perto da metade dos medicamentos sofrer mais fortemente o impacto do câmbio. Em nada ajuda tampouco a controlar os custos a tendência que se observa nos hospitais de valorizarem procedimentos de hotelaria, que pouco ou nada tem a ver com a medicina que ali se pratica.

Felizmente, ao elevado número de desafios corresponde uma igual disposição de superá-los. É sabido, por exemplo, que planos de saúde em autogestão reúnem uma massa de participantes com idade média superior à registrada pelo segmento da saúde suplementar. No entender de Rogério Braz, da Eletros, uma forma de amenizar o problema é “buscarmos uma forma de oxigenar as carteiras com uma maior presença de jovens”. Algo que se poderá conseguir abrindo os planos para familiares dos atuais participantes, até o 4º grau de parentesco.

Soluções, claro, não costumam ser fáceis. Para angariar novos públicos o plano de autogestão sujeita-se em maior   grau à competição no mercado, uma vez que, nota Rogério, não basta atrair, é preciso depois que se consiga reter. Os planos oferecidos pelos fundos de pensão já levam uma importante vantagem por serem reconhecidamente muito competitivos no quesito preço.

Fonte: Diário dos Fundos de Pensão (03/08/2015)

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