sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Fundos de Pensão: Assoc. Aposentados do BB (AAPBB) envia memorial ao Procurador da República contra a Reversão de Valores de superavits às patrocinadoras, contida na Resolução CGPC 26


Veja a íntegra do Memorial redigido pela AAPBB (Associação dos Aposentados e Pensionistas do Banco do Brasil) e encaminhado ao Procurador da República contestando parecer da PREVIC que autoriza devolução de valores de superavits às patrocinadoras de fundos de pensão contido na Ação Civil Pública ingressada pela Associação em 2014:

    
ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO BANCO DO BRASIL - AAPBB
Av. Rio Branco, 185, Sala 612 Tel: (21)2232-7561 Fax: 2509-0347 CEP 20040-007
Centro Rio de Janeiro – RJ / Site: www.aapbb.org.br – E-mail: aapbb@aapbb.org.br



M E M O R I A L

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR ALBERTO NOGUEIRA JUNIOR, MERITÍSSIMO JUIZ FEDERAL DA 10ª VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO-RJ

AÇÃO CIVIL PÚBLICA n° 0114138-20.2014.4.02.5101 (2014.51.01.114138-11)

A Associação de Aposentados e Pensionistas do Banco do Brasil – AAPBB, sediada na Avenida Rio Branco n° 185, Conjunto 612 – Centro - CEP 20040-007 – Rio de Janeiro – RJ, representante de aposentados e pensionistas da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil – PREVI, respeitosamente submete à apreciação de Vossa Excelência o presente memorial. E o faz na condição de autora da representação[1] que originou o contencioso à epígrafe, após judicioso exame do ilustre representante do Ministério Público do Rio de Janeiro, motivo pelo qual expressa seu interesse na cabal apuração dos fatos ali citados.
Por tais razões, e como os defensores da “Reversão de Valores” -, eufemismo com o qual a Resolução CGPC 26/08 designou a ilegal devolução da contribuição patronal, apresentando esta (a) como se fosse um ônus suportado pelo patrocinador, ignorando deliberadamente o fato de ser ela transferida nos preços ao consumidor; e (b) apelam para o silogismo, alegando que a citada resolução se tornou necessária para corrigir uma omissão do legislador, que ao autorizar a redução da contribuição patronal, logo estaria a indicar que a devolução deveria ser outra forma de ressarcir o patrocinador com a devolução das contribuições excessivas por ele vertidas.
Não o fundamenta com a citação dos artigos da legislação específica muito bem expostos na Réplica ofertada à Contestação da PREVIC. Em vez disso, procura refutar as insidiosas alegações da Ré, com fundamento na norma sistemática de interpretação Constitucional de Hermenêutica Jurídica ,que aponta  os fatos nos quais se fundamentou o legislador para autorizar a redução da contribuição patronal, mas não a sua devolução.
 Pretende, por isto mesmo, expor as relevantes razões pelas quais o legislador da LC 109/2001, Orgânica da Previdência Complementar, autoriza a redução das  contribuições vertidas por empresa patrocinadora, estatal ou privada, nas hipóteses de apuração de superávit por planos de benefícios  administrados por Fundo de Pensão; mas não autoriza a sua devolução -, conforme pretendem os autores da Resolução CGPC  26/2008 nos artigos 20, Inciso III, 25, 26 e 27, sob o eufemismo de reversão de valores, em inadmissível violação dos artigos 3º inciso VI, 19, 20 e 21, da citada LC 109/2001, que dispõe sobre a destinação  dos superávits dos Planos de Benefícios administrados pelas EFPCs.
Para tanto, recorre à norma sistemática de interpretação constitucional da Hermenêutica Jurídica, que busca correlacionar todos os dispositivos normativos da Constituição para elucidar a interpretação a partir do conhecimento do todo.
Nesse sentido, o filósofo Hans KELSEN, considerado um dos maiores teóricos do Direito no século vinte,  tem a visão do sistema jurídico como se fosse “uma pirâmide normativa na qual temos no topo a Constituição: abaixo a legislação, em seguida, os atos administrativos e posteriormente os contratos  e decisões. Todos esses componentes da pirâmide tem de ser interpretados juntamente com a Constituição; todas as normas jurídicas devem ser lidas e relidas através da Constituição, sendo denominado de  FILTRAGEM HERMENÊUTICA para o neoconstitucionalismo[2].”
“Uma das acepções sobre a hermenêutica jurídica refere-se à interpretação do “espírito da lei”, ou seja, de suas finalidades quando foi criada.  É entendida no âmbito do direito como um conjunto de métodos de interpretação consagrados.  O objeto de interpretação privilegiada do direito é a norma, mas não se limita a ela (pode se interpretar o ordenamento jurídico, a lei positiva, princípios[3]”).
Por sua vez, Paulo de Barros Carvalho, advogado tributarista da Faculdade de Direito da USP,  entende que “a hermenêutica fornece tão somente os instrumentos de interpretação dos enunciados jurídicos com fins de construção do sentido da norma jurídica, ou seja, a norma jurídica não está na lei, mas na cabeça do intérprete, que a constrói (a norma) baseado nos textos jurídicos enunciados na vasta legislação existente, mediante a utilização de determinados métodos previamente selecionados pelo intérprete.  Não existe “vontade” ou “espírito” na lei, mas sim a vontade do legislador na época da criação da lei, da qual se pode construir uma norma jurídica baseada na realidade contemporânea de cada intérprete da lei ao criar a norma jurídica aplicável a cada caso”.
Para Paulo Barros de Carvalho a Hermenêutica “fornece tão somente os instrumentos de interpretação dos enunciados jurídicos com fins de construção.”
A propósito, cite-se como exemplo, o trecho a seguir transcrito, da “Exposição de Motivos” da Minuta da Resolução CGPC 26/09, que instituiu a “reversão de valores” no ordenamento jurídico da Previdência Complementar: 
“O assunto adquiriu especial relevância considerando, inclusive,  a demanda junto à Secretaria de Previdência Complementar, seja por meio de consultas ao Departamento de Legislação e Normas,  de alterações regulamentares submetidas ao Departamento de Análise Técnica ou pela própria necessidade de definição do tema sob a ótica da fiscalização dos planos de benefícios”.
A interpretação do enunciado jurídico é que a citada Resolução  resultou do atendimento de “demanda junto à Secretaria de Previdência Complementar”, por demandante(s) não revelado(s).
Vamos ao tema.
DA ORDEM ECONÔMICA
É privada a Ordem Econômica instituída no Art. 170 e incisos, da Constituição Federal a seguir transcritos:
“Art. 170 – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:” (EC nº 6/95 e EC nº 42/2003) (g.n.o.)
I – “soberania nacional”;
II – “propriedade privada”;
III – “função social da propriedade”;
IV -  “livre concorrência”; (g.n.o.)
V – “defesa do consumidor”;
          VI – “defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação”.               
Por sua vez, o Art. 173, §§, e incisos, da CF, dispõe verbis:
“Art. 173 – Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta da atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definido em lei”. (EC  nº  19/98)
“§ 1º.  A Lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre” :
     “I – Sua função social e forma de fiscalização pelo Estado e pela sociedade”;
     “II – A sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias”; (g.n.o.)
     “III – Licitação e contratação de obras, serviços, compras e alimentações, observados os princípios da administração publica”;
     “IV – A constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários”;
     “V – Os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores”.
“§ 2º.  As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado”.
“§ 3º.  A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade”.
“§ 4º. A lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”.
“§ 5º. A lei, sem prejuízo da responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza, nos atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra a economia popular”.
Da  apuração de custos e sua incorporação aos preços.
Toda empresa, seja industrial, comercial ou de prestação de serviços, precisa determinar, com precisão, seus preços de venda, sob pena de perder mercados (por praticar preços acima da concorrência) ou sofrer prejuízos pela venda de seus produtos, mercadorias e serviços abaixo do custo”. [4] 
Para não perder mercados, eis que atua no regime de livre concorrência (art.170, inciso IV, da CF) -, constatando que pratica preço superior ao da concorrência, a empresa, estatal ou privada -, de produção, de comercialização de bens, ou de prestação de serviços, reduz seus custos e transfere, nos preços[5], o benefício para o consumidor. Assim procede movida pelo interesse de permanecer no mercado em posição competitiva.
Sob tais fundamentos, não se pode ignorar as duas faces da mesma moeda. Uma relacionada com o mecanismo de formação de custos e preços; no qual avulta o papel da empresa como agente repassador dos custos aos preços Por esse sistema, é o cidadão quem paga, como consumidor e como contribuinte, todos os custos de produção, de prestação de serviços, de comercialização, o lucro e os impostos indiretos. Assim, ao efetuar a venda, a empresa “zera” todos os custos, inclusive os encargos sociais.- EM TAIS CONDIÇÕES O PATROCÍNIO DE UM FUNDO DE PENSÃO NÃO É ONEROSO.
Do Sistema Tributário e da Renúncia Fiscal.
 A outra é a representada pelo sistema tributário e fiscal, excessivamente oneroso, baseado no consumo, não na renda e generoso na renúncia fiscal.
. Além de transferir seus custos, acrescidos do lucro e dos impostos indiretos, via inclusão nos preços, para o consumidor/contribuinte, a empresa de produção e de prestação de serviços, é beneficiada pelo incentivo fiscal de natureza previdenciária, via redução da base de cálculo, mediante lei específica, prevista no artigo 150 § 6º da CF. Beneficia, igualmente, as empresas privadas e os entes estatais, por força do disposto no artigo 173 § 2º da CF.
A legislação autoriza a dedução das contribuições destinadas ao custeio de seguros, planos de saúde, e benefícios complementares assemelhados ao da previdência social (instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica) antes da apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido.  Beneficia, inclusive, as empresas que patrocinam fundos de pensão para os quais os beneficiários não contribuem.
A partir da lei nº 9532/97 a dedução ficou limitada a 20% do total dos salários dos empregados e da remuneração dos dirigentes da empresa, mas em compensação foi autorizada a dedução da contribuição para o Fundo de Aposentadoria Programada e Individual - FAPI, limitada aos mesmos 20%.  São tantas as vantagens que numerosas empresas nacionais e estrangeiras patrocinam Fundo de Pensão e não cobram contribuição dos beneficiários.  Quem paga os custos é o cidadão consumidor/contribuinte.
        O desfrute das vantagens financeiras da renúncia fiscal torna lucrativo o patrocínio de um Fundo de Pensão.
Dos Fundamentos de Justiça Social.
Ainda assim, deve-se admitir como normal e natural no sistema de economia de mercado que o Estado ofereça incentivos às empresas que se preocupam com o bem estar social de seus empregados, suprindo a ineficiência do poder público sem as mazelas que caracterizam a ação estatal na área social.  Mas, não ao ponto de devolver a ficção jurídica que é a empresa, uma contribuição que ela já repassou nos preços ao cidadão consumidor/contribuinte.
Não.  Porque a adoção de tal medida constituiria uma perigosa inversão até mesmo de valores morais.  Significaria considerar o superávit como se fosse lucro; a empresa, em vez de patrocinadora, como se fosse sócia,  com direito à participação no lucro para distribuí-lo a seus acionistas como se fosse o resultado de suas atividades fins.  Seria incompatível com os fundamentos da justiça social, da legislação específica sobre a destinação de superávits e dos valores republicanos essenciais à convivência democrática e civilizada.
Da lei complementar 109/2001, orgânica da Previdência Complementar
Foi inspirado nos fundamentos acima expostos que o legislador, ao normatizar o § 3º do artigo 20 da Lei Complementar 109/2001, autorizou a redução da contribuição vertida pela empresa patrocinadora na eventual apuração de excedentes pelo Plano de Benefícios; e o fez por considerar que no regime de livre concorrência (art. 170, IV, da Constituição Federal) essa redução seria repassada ao consumidor, via redução de preço.         
Pela mesma razão, relacionada com o  mecanismo de apuração de custos + lucro + impostos indiretos = preços de venda, acrescidos das benesses da renúncia fiscal, o legislador jamais autorizou a devolução à empresa patrocinadora das contribuições por ela vertidas mas cujo ônus transferiu para o consumidor. Se autorizasse estaria transformando o patrocinador no maior beneficiário do Plano de Benefícios, em uma verdadeira inversão até mesmo de valores morais. Estaria devolvendo em dobro ao patrocinador um valor pago pelo consumidor. Se autorizasse, como fez a Resolução CGPC 26/08, sob o eufemismo de “reversão de valores” promoveria o enriquecimento sem causa do patrocinador, um ilícito previsto nos artigos 884 e 885 do Código Civil Verbis:  
“Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários”.
§ único – Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido”.
“Art. 885 – A restituição é devida não só quando não tenha havido causa        que justifique o enriquecimento, mas também se esta deixou de existir”.
Em suma, foi a realidade inerente aos princípios gerais da atividade econômica, da Ordem Econômica e Financeira do Pacto Constitucional de 1998, dispondo sobre empresa estatal e empresa privada, de produção, de comercialização de bens e de prestação de serviços, equiparadas na forma do inciso II, do § 1º, e do § 2º, do artigo 173 da Constituição Federal, que inspirou o legislador na elaboração de leis, dentre as quais as que dispõem sobre o sistema de previdência complementar.
Na elaboração da legislação específica, o legislador considerou o papel desempenhado pela empresa estatal e privada como agentes repassadores dos custos aos preços e como agentes arrecadadores gratuitos de tributos por conta do governo, transferindo tais ônus para o consumidor/contribuinte e ainda são beneficiadas pela renúncia fiscal.
Considerou, ainda, que no regime de livre concorrência, da Ordem Econômica,  estabelecida no artigo 170, II e IV, da CF, a empresa privada e estatal, de produção,  comercialização de bens, e prestação de serviços, quando beneficiadas por redução de custos, transferem o benefício para o consumidor, no interesse próprio de sua permanência no mercado.
Baseada nessa realidade está a sábia decisão do legislador de autorizar a redução da contribuição da empresa patrocinadora de Fundo de Pensão na hipótese de superávit apurada pelo Plano de Benefícios, mas não autorizar  a devolução da contribuição por ela vertida, mas paga pelo consumidor/contribuinte ainda que sob o eufemismo de reversão de valores, para não promover o seu enriquecimento sem causa.
Desnuda também, o caráter inverídico da falaciosa alegação ofertada pela Ré, nos itens 97/99, da Contestação, segundo a qual a não devolução da contribuição vertida pela empresa estatal de produção de bens ou de prestação de serviços, mas paga pelo consumidor “significa impor um ônus indevido ao Estado nas hipóteses de undos patrocinadis por entes estatais.” (sic)
Mais: não corresponde a verdade a insidiosa alegação ofertada pela PREVIC nos itens 97/99 da contestação.  Em primeiro lugar por que as empresas estatais do setor de produção, comercialização de bens ou prestação de serviços, não são “patrocinadores públicos” como se afirma no item 97.  São sociedades de economia mista juridicamente constituída como sociedades anônimas, entidades de direito privado; ademais equiparadas às empresas privadas na forma do inciso II do § 1º  do art. 173 da CF.
Na verdade, como já foi dito, as contribuições por elas vertidas no processo de produção ou de prestação de serviços, são transferidas, nos preços de venda para o consumidor, que é quem fica com o ônus de tais contribuições.  Portanto afirmar que são pagas pelos cofres públicos afronta a verdade, a Constituição Federal, a Lei, a lógica e o bom senso.
Aceite Vossa Excelência os protestos de nosso maior apreço.


                    Atenciosamente



_______________________________            _______________________________
RUY BRITO DE OLIVEIRA PEDROZA                      NELSON BOMFIM RIBEIRO
      PRESIDENTE                                        VICE-PRESIDENTE DESENVOLVIMENTO




[1] - Anexo 1, da Petição inicial.
[2] Fonte: Wikipédía
[3] Fonte: Wikipédia
[4] Definição do Contabilista Júlio Cesar Zanluca, autor de obras sobre custos e preços.
[5] A apuração do preço é efetuada pela apropriação contábil de todos os custos diretos e indiretos, fixos e variáveis, acrescidos do lucro e dos impostos indiretos.

Fonte: AAPBB (06/08/2015)

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