segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Aposentadoria: Fuga em massa da previdência privada aberta em função do baixo rendimento de 2013

Após dois meses consecutivos de desempenho médio negativo em todas as categorias de fundos de previdência aberta, renda variável e fixa, os investidores não resistiram e os saques superaram as aplicações no segmento em julho, pela primeira vez em pelo menos cinco anos. É o que mostra levantamento com 727 fundos de previdência realizado pelas consultorias NetQuant e Towers Watson.

Em julho, o saldo líquido de aplicações em fundos de previdência aberta ficou negativo em R$ 1,041 bilhão, com os saques concentrando-se nas carteiras de renda fixa. Esses fundos, que reúnem 88% do patrimônio do setor (ou R$ 259,8 bilhões) e vinham puxando o crescimento da indústria nos últimos anos, tiveram resgates líquidos equivalentes a R$ 662,4 milhões no mês passado. O volume é pequeno se comparado ao total captado no ano até julho - R$ 14,6 bilhões -, mas reforça a percepção de que o investidor de previdência não tolera volatilidade.

Os fundos compostos, com uma parcela em ações, por exemplo, vêm amargando saídas mensais desde janeiro de 2011, dado o desempenho ruim da bolsa há tempos. No mês passado não foi diferente. Os resgates somaram R$ 455,4 milhões, o que elevou as saídas no ano para R$ 2,5 bilhões. Em patrimônio, essas carteiras administram cerca de R$ 23 bilhões, ou seja, menos que 8% do total.

Em julho, apenas os multimercados sem renda variável, com mais liberdade para aplicar, seguiram com captação positiva, ainda que pouco relevante: R$ 76,2 milhões. No ano, o segmento, com R$ 11,3 bilhões em ativos sob gestão (fatia menor que 4%), atraiu cerca de R$ 1,5 bilhão.

"É inegável, a saída de recursos em julho é reflexo da performance de maio e principalmente junho", diz Gustavo Lendimuth, superintendente de seguros, capitalização e previdência do Santander. Em junho, os fundos de previdência de renda fixa (os mais representativos) fecharam no negativo. Na média, a perda foi de 0,06%, segundo o levantamento. Em fundos com taxa de administração superior a 3%, a variação negativa foi maior, de 0,43%, ante um CDI de 0,59%. Em julho, essas carteiras apresentaram recuperação, com retorno de 0,55%, em média, contudo ainda abaixo do CDI, que foi de 0,71%.

Lendimuth afirma que o desempenho ruim está ligado a um ajuste, iniciado pelo setor há cerca de dois anos, para um cenário de juros menores. A indústria partiu para um alongamento do prazo das carteiras e uma exposição maior em títulos públicos prefixados (LTN e NTN-F) e indexados à inflação (NTN-B), a fim de não perder competitividade. "Com a Selic despencando o investimento pós-fixado deixou de ser interessante. E a previdência, com taxa de administração, passou a ter um retorno equivalente à poupança", diz.

Além disso, uma resolução do governo obrigou os gestores de previdência aberta a iniciar a substituição de aplicações de curto prazo e indexadas à Selic por papéis mais longos. O prazo para a mudança começou a valer no fim de maio, e deve seguir até 2015. Isso significa que o movimento de alongar os prazos e ampliar a exposição em papéis com taxas prefixadas começou tardiamente, em um momento pior de mercado, pontua Marcelo Nazareth, sócio-diretor da NetQuant. "Quando o governo fez a proposta, o mercado assinalava para uma queda de juros. Mas, quando a indústria começou a alongar, o juro voltou a subir, o trouxe muita volatilidade", reforça Eduardo Freitas, vice-presidente de previdência da Mapfre.

Em 2011 e 2012, tal estratégia em busca de retornos mais competitivos mostrou resultados, diz Lendimuth, do Santander. Entre janeiro e julho do ano passado, os fundos de previdência de renda fixa renderam, na média, 5,48%, ou 103,4% do CDI do período (5,30%). Já a poupança rendeu 3,84%. Neste ano, contudo, o retorno médio das carteiras de renda fixa até julho foi de 1,94%, o equivalente a 46,6% do CDI (que variou 4,16%) e abaixo ainda dos 3,05% da "nova" poupança (cuja variação representa 70% da Selic desde que igual ou inferior a 8,5% ao ano), alternativa que absorveu boa parte dos recursos de previdência (leia análise abaixo).

Muito da piora da performance está associada aos efeitos negativos da marcação a mercado dos papéis mais longos e prefixados em carteira, por conta da retomada do ciclo de aperto monetário - a perspectiva de alta da Selic provocou a abertura das taxas dos títulos públicos e no mercado futuro, o que provocou uma desvalorização dos ativos. O IMA-B, índice que acompanha o desempenho de uma cesta de NTN-Bs, caiu 4,52% em maio e 2,79% em junho. Já em julho, o IMA-B subiu 1,29%.

"Todos têm a ideia de que um fundo de renda fixa jamais vai ter uma oscilação grande, isso não é verdade", diz Lendimuth. Nos últimos três meses, com a mudança para um ciclo de aperto monetário e mercados mais voláteis, parte dos retornos foi devolvida, afirma o executivo. "A indústria se machucou, mas é um pequeno ajuste."

Conforme destaca Altair César de Jesus, superintendente de investimentos da Brasilprev, empresa de seguros e previdência do Banco do Brasil e do Principal Financial Group, previdência privada com característica de curto prazo, como tem sido, não faz sentido. Na Brasilprev, ele diz que o prazo médio das carteiras gira em torno de 600 dias, está acima dos 150 dias a um ano do mercado em geral, mas ainda assim é pequeno para a previdência cujo horizonte deve ser de pelo menos dez anos.

A resolução do governo visa ampliar o prazo médio da indústria de previdência para cerca de três anos até 2015. Mas pode ganhar flexibilidade, diante da reação do investidor. Segundo os executivos, a Fenaprevi, entidade que representa o setor, mantém conversas com a Secretaria de Política Econômica em busca de alternativas para implementar as mudanças de forma a minimizar o impacto para o participante. Entre as opções em pauta, segundo Freitas, da Mapfre, estão a flexibilização do prazo para o ajuste e o uso de derivativos para minimizar a volatilidade.

"A estratégia é correta, tem que alongar, mas o cliente não estava preparado", diz Lendimuth, do Santander. Por outro lado, defende Jesus, da Brasilprev, o momento é oportuno para travar taxas maiores, como um juro real próximo de 6% nas NTN-Bs. "Daqui para frente, dificilmente o investidor vai ter o tripé segurança, liquidez e retorno. Para ter retorno, ele vai ter de alongar o prazo", diz. Isso porque, segundo o executivo, num horizonte de longo prazo a tendência do juro segue de baixa. Para ele, não só o alongamento dos prazos vai ser fundamental como o aumento da exposição em bolsa.

Na visão de Freitas, da Mapfre, o brasileiro não conhece o seu perfil, nem seus objetivos e prazos. Trocar a previdência hoje por poupança, exemplifica, é "abrir mão do risco de ganhar pela certeza de perder". Ele refere-se aos benefícios fiscais da previdência que o investidor vai perder se fizer a troca e ao juro real negativo da poupança.
Fonte: Valor (26/08/2013)

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