quarta-feira, 12 de junho de 2013

TIC: Esforço e concessão do governo para transformar Oi na supertele nacional pode ruir. Portugal Telecom entra com apetite para controlar

Quatro anos depois de uma longa articulação que culminou na compra da Brasil Telecom pela Oi, o esforço do governo brasileiro para a criação de uma supertele nacional está prestes a ruir. A escolha do moçambicano Zeinal Bava, que deixou a presidência da Portugal Telecom para comandar a Oi, coloca a operadora brasileira mais perto de uma mudança de controle, o que pode concretizar as aspirações de um país e destruir as de outro.

Com crescimento limitado na Europa, o grupo português luta, há anos, para controlar uma operadora no Brasil. A primeira tentativa foi frustrada, quando os portugueses perderam o controle da Vivo para a Telefónica, antiga sócia espanhola nessa operadora. Paralelamente, a Portugal Telecom decidiu apostar todas as fichas na Oi. A partir daí, aumentou a desconfiança do mercado brasileiro sobre o futuro da supertele nacional.

Agora, com Zeinal, representante dos sócios portugueses no comando da Oi, ficou mais bem pavimentada a via para uma transferência acionária. Caso as expectativas se confirmem, se poderá dar adeus à única das quatro grandes teles ainda com maioria de capital nacional.

Reorganização societária daria à Portugal Telecom controle da única grande tele brasileira

Não foram poucas as concessões para permitir que a Oi comprasse a Brasil Telecom. Imagine o Brasil dividido, no início da privatização do Sistema Telebras, em três regiões, pelo Plano Geral de Outorgas. Foi essa a divisão geográfica estabelecida para a oferta de serviços de telefonia fixa tradicional, ou comutada, e garantir a competição.

A Oi, ex-Telemar, ficou com a região I, com 16 Estados, do Rio de Janeiro ao Amazonas, seguindo pela costa do país; a Brasil Telecom com a região II, desde o Rio Grande do Sul, passando pelo Centro-Oeste, até o Acre; e a Telefônica ficou com a região III, o Estado de São Paulo. CTBC e Sercomtel também são concessionárias, mas pequenas, comparadas às rivais. A CTBC está em localidades de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, enquanto a Sercomtel está em duas cidades do Paraná.

Ao autorizar o processo de aquisição entre companhias que praticamente dividiam o país ao meio, o governo concordou em eliminar um competidor e entregar à Oi a exploração da telefonia fixa em quase todo o país, exceto São Paulo. Surge daí o conceito de supertele, com a proposta de ser nacional.

Não foi simples, também, a engenharia política, regulatória e financeira do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para permitir esse acordo societário. Restrições ao negócio tiveram que ser derrubadas, após debates que duraram meses. Uma das exigências era que a nova empresa resultante da aquisição separasse juridicamente as operações de telefonia fixa e banda larga. A Oi ameaçava cancelar a aquisição se a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) não cedesse nesse ponto, e acabou vitoriosa. Os argumentos contrários ao negócio citavam a possibilidade de prejuízo ao interesse público e falta de clareza sobre o que os consumidores ganhariam com isso.

O governo brasileiro, com o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente, foi firme em seu propósito de aprovar a aquisição. O governo português, liderado por José Sócrates, afirmava que, se saísse da Vivo, o grupo tinha de continuar no Brasil e, assim, acompanhava os negócios de perto. O governo de Portugal chegou a usar a 'golden share' (ação de classe especial detida pelo poder público) para vetar a venda da Vivo à Telefónica, que fora aprovada por acionistas da Portugal Telecom à época.

Em defesa da Oi, um argumento usado pela operadora e endossado pela agência reguladora era a possibilidade de a nova supertele se lançar no mercado internacional, inicialmente em países de língua portuguesa.

Superados todos os obstáculos, a regulamentação foi alterada e a Anatel criou exigências para adequar as normas ao novo cenário competitivo, com mudanças na Lei Geral de Telecomunicações.

Agora, o cenário é bem diferente, com a influência crescente dos portugueses. Em 2010, a Anatel autorizou o ingresso da Portugal Telecom na Oi. Hoje, a participação da companhia portuguesa chega a 25,28% da Telemar Norte Leste, holding que controla a Oi.

O plano de internacionalização da Oi, por sua vez, foi várias vezes adiado até ser colocado de lado. Pode ser que no futuro, sob o guarda-chuva do grupo português, o plano tenha chance de ser bem-sucedido.

No primeiro trimestre deste ano, o Brasil registrou 44,3 milhões de linhas fixas em serviço. A Oi lidera o mercado, com participação de 41,73%, seguida pela Telefônica, com 23,54%. Na sequência estão operadoras autorizadas: Embratel, com 22,25%; GVT, 8,36%; CTBC, 1,86%; e TIM, 1,43%.

Mas o mercado mudou bastante desde 2010. Os pacotes de serviços conquistaram mais importância no portfólio e na receita das empresas. Telefonia fixa e móvel, TV por assinatura e banda larga compõem a receita de produtos para os consumidores. A Oi nasceu com essa vantagem, ao reunir desde o início o conjunto de serviços. Mas não conseguiu ser assertiva em uma estratégia que garantisse um crescimento relevante e a colocasse na dianteira de todos os serviços.

Em serviços móveis, a Oi está em quarto lugar no ranking, com 18,74% de participação, a menor entre as quatro grandes operadoras. A Oi tem 5,1% do mercado de TV Paga, muito distante da líder Net, com 52,1%. A situação melhora em banda larga fixa, em que a Oi está no topo do ranking, com 29,7%, perigosamente próxima da Net, com 28,8%.

O empacotamento de produtos é um trunfo da Portugal Telecom em seu território de origem. Sob a batuta de quem conhece bem como harmonizar serviços diferentes, a Oi tem uma nova chance de escalar posições de mais visibilidade e rentabilidade para seus investidores, depois de resolver como equacionar pagamento de dividendos e investimentos. Esse último ponto, aliás, é o 'calcanhar de Aquiles' da operadora e derrubou o presidente anterior da companhia, Francisco Valim, que insistia em manter seu plano de investimentos para avançar no mercado, mas não contou com o apoio dos acionistas. É um nó importante que Zeinal terá que desatar. O endividamento da tele é alto, ainda sob o impacto da compra da Brasil Telecom e da reestruturação das empresas do grupo.

Para o consumidor, resta esperar que nesse novo cenário que se desenha haja garantia de mais qualidade de serviço e menores preços. Até agora, isso é um sonho para os usuários. É o que mostra o ranking de empresas com mais reclamações na lista de todos os Procons divulgada pelo Ministério da Justiça no ano passado. A Oi aparece no topo da lista, com mais de 120 mil queixas. No acumulado até 6 de junho deste ano, no levantamento específico de São Paulo, a operadora está em sétimo lugar, lista que é encabeçada pela Vivo, seguida por Itaú Unibanco, Claro, Bradesco, TIM e Net.
Fonte: Valor (12/06/2013)

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