quarta-feira, 13 de março de 2013

Fundos de Pensão expostos aos títulos públicos atrelados a inflação poderão apresentar prejuízos após um 2012 de fortes lucros



A ruptura nas expectativas sobre a manutenção dos juros no Brasil abalou a justificada euforia de alguns investidores da previdência privada em fevereiro. Uma pesquisa exclusiva realizada pelas consultorias NetQuant e Towers Watson mostra que os fundos mais expostos aos títulos públicos atrelados à inflação registraram prejuízo no mês. Alguns ficaram mais de 1% negativos. O resultado frustrante de agora, porém, ocorreu, na maioria dos casos, em fundos que tiveram desempenho acima da média quando se observa o rendimento dessas carteiras nos últimos 12 meses, período em que os portfólios foram beneficiados pelo chamado "fechamento da curva de juros". Os ganhos foram de 20% ou mais, como é o caso do fundo de investimento em renda fixa da Luterprev (+31,77%), uma pequena entidade de previdência que, em sua origem, atendia o clero da igreja luterana no Rio Grande do Sul. "De uma forma geral, os fundos que tiveram o melhor desempenho no ano passado são aqueles que mais sofreram em fevereiro", afirma Marcelo Nazareth, sócio-diretor da NetQuant.

Tanto no caso do Luterprev PRGP FI RF quanto no do CSHG Mapfre Juro Real FICFI (veja a tabela nessa página), a exposição às notas do Tesouro Nacional Série B (NTN-B e NTN-B Principal) era praticamente integral. No caso do PRGP (Plano com Remuneração Garantida e Performance) da Luterprev, a estratégia é basicamente comprar títulos públicos atrelados ao índice de preços oficial, o IPCA, com os prazos mais longos. Sempre que o Tesouro oferece papel com um vencimento mais longo, o gestor busca substituir os ativos. "É um fundo com, pelo menos, 95% da carteira com títulos indexados à inflação e duration de 20 anos ou mais", diz Everson Oppermann, diretor-geral da Luterprev.


Uma situação semelhante levou um fundo de previdência do Santander a uma perda de 1,40% no mês, a maior entre os portfólios sem renda variável, segundo o levantamento. "Esse é um fundo exclusivo para um investidor e que carrega estruturalmente [deve permanecer com]

os títulos até o vencimento. É um produto com cerca de 74% do patrimônio em NTN-Cs, um título atrelado ao IGP-M que o Tesouro nem oferece mais", afirma Aquiles Mosca, estrategista para pessoa física da Santander Asset Management.

O estrategista da gestora de recursos do Santander e Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos, afirmam que é natural que os portfólios com títulos mais longos sofram mais em momentos de instabilidade. "A sinalização do Banco Central de um novo aperto monetário fez com que os fundos oscilassem mais. Em momentos de menor instabilidade, estes mesmos fundos tendem a responder melhor do que as carteiras mais conservadoras [e com títulos mais curtos]", afirma Mello.

Um bom exemplo são as carteiras da J.Safra Asset Management que, de acordo com Fabiano Godoi, superintendente executivo da gestora de recursos do grupo Safra, carregam títulos mais curtos. A rentabilidade dos três fundos de previdência renda fixa tiveram desempenho positivo no mês, em linha com o retorno médio da categoria, de 0,15%, segundo o levantamento da NetQuant e Towers Watson. "O 'duration' curto das carteiras tem protegido o fundo neste momento. Obviamente, é uma situação conjuntural", diz Godoi.

Fundos de previdência patinam em fevereiro

A pergunta que qualquer participante pode estar se fazendo é se, mesmo em uma aplicação tão conservadora, as perdas continuarão neste mês ou mesmo nos próximos meses. Para Marcelo Arnosti, economista-chefe da BB DTVM, gestora de recursos do Banco do Brasil, os títulos públicos atrelados à inflação, chamados NTN-Bs, não devem provocar sustos tão grandes nos próximos meses. O motivo é o fato de a curva de juros já ter embutido uma alta na taxa básica, a Selic, de 1 a 1,5 ponto percentual até o fim do ano. "Após semanas tendo perda de valor, os papéis indexados devem mostrar comportamento mais estável. Isso porque a curva de juros já embutiu entre 100 e 150 pontos-base de alta, e a inflação 'embutida' nos papéis [a chamada inflação implícita] já foi corrigida", diz Arnosti.

Outra questão macroeconômica que tende a afetar os portfólios indexados à inflação é a desoneração da cesta básica. A medida anunciada pela presidente Dilma Rousseff na noite da última sexta-feira levou à redução das taxas de juros futuros no mercado financeiro. Na segunda-feira, por exemplo, os contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) na BM&FBovespa para janeiro de 2014 caíram de 7,96% ao ano para 7,85% ao ano.

O economista da BB DTVM argumenta que, se por um lado, as desonerações beneficiam quem investe direta ou indiretamente nos papéis atrelados ao IPCA, por outro, podem vir a prejudicar. "Por conta da provável menor inflação para 2013, os papéis mais curtos devem mostrar neutralidade: serão favorecidos pela curva de juros nominais menos volátil, mas prejudicados pela possível queda da inflação esperada embutida de curto prazo", diz Arnosti.

Mello, da SulAmérica, afirma que o investidor deveria olhar para eventos como esse como uma oportunidade de aumentar a aplicação. "O portfólio está mais gordo em termos de taxa. É um momento de investir mais", diz o executivo. Procuradas pela reportagem, as gestoras e entidades de previdência Icatu Seguros, Bradesco, Itaú Unibanco, Mapfre e CSHG não concederam entrevista.

Para William Eid Junior, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), o atual momento exige desse investidor conservador maior tolerância ao risco. Ele argumenta que não faz sentido fugir de perdas eventuais como a de fevereiro. O poupador não encontraria muitas alternativas caso decidisse portar seus recursos para outro fundo de previdência. Na hipótese de seguir esta alternativa, Eid reforça a necessidade de análise da consistência dos resultados.

Uma estratégia é comparar os retornos semestrais dos fundos em um horizonte de, no mínimo, cinco anos. "Para avaliar a qualidade da gestão, não basta comparar o retorno acumulado em um período longo, porque o gestor pode ter conseguido um resultado excepcional em um determinado ano que acabou compensando as perdas nos outros períodos", afirma Eid.

Mais importante do que se preocupar com essa volatilidade do desempenho das carteiras de renda fixa que possuem títulos mais longos - que tende a ser momentânea, segundo os especialistas - pode ser observar o tamanho da taxa de administração cobrada. Isso porque este custo, que é fixo, está contribuindo para baixar as rentabilidades, conforme mostram os dados da pesquisa da NetQuant.
Fonte: Valor (13/03/2013)

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